Antes de adentrarmos nas curiosidades – tanto históricas quanto conceituais– que serão discutidas aqui, que são o tópico principal, digressionaremos a um ponto importante: precisamos perceber o quão necessário é um grande reconhecimento dos feitos Austríacos e também da Escola Austríaca propriamente dita. Poucos, nos dias atuais, possuem-no.

Em contraste com o passado, até mesmo grandes “oponentes” reconhecem a importância e os feitos de nossa querida linha de pensamento. Usando, como ilustração, as palavras de Nikolai Bukharin, um importante escritor de uma grande e famosa linha de pensamento que você, caro leitor, já deve estar bastante cansado de ouvir… que é a marxista.

Bukharin diz-nos que:

É muito bem conhecido que o mais poderoso oponente do Marxismo é a Escola Austríaca” e diz anteriormente que “nossa seleção de um oponente para nossa crítica provavelmente não requer discussão.” Apesar dos pesares, essa é, também, uma curiosidade. Mas voltemos ao tópico principal…

A origem da Escola Austríaca

A maior parte da difusão do pensamento Mengeriano se deu, na década de 80 (de 1800),  devido a dois de seus “alunos” e também devido à genialidade de sua obra. Eugen von Böhm-Bawerk e Friedrich von Wieser foram grandes nomes para a época, não só pelo desenvolvimento dos pensamentos mengerianos, mas também pela difusão deles.

Dizemos “alunos” pois, aqui cabe outra curiosidade, o que eles aprenderam com Menger foi através do Grundsätze der Volkswirtschaftslehre, o livro que conhecemos no contexto brasileiro por Princípios de Economia Política e que tem por tradução literal o nome de Proposições Fundamentais da Economia da Nação. Eles não chegaram a “ter aulas” com Menger, apesar de serem seus “alunos”. Visto que, um livro tal como esse, é de fato um conjunto de aulas fundamentais para aquele que o lê.

Outra curiosidade que cabe aqui, é que tal livro é aquilo que deu o “pontapé inicial” do que conhecemos hoje por Escola Austríaca, tanto como capítulo histórico quanto escola de pensamento atual.

A primeira grande contribuição da Escola Austríaca

Lançado em 1871, na Áustria. Ainda de acréscimo, Menger, junto de Marie-Esprit-Léon Walras e William Stanley Jevons deram início, na década de 70, à Revolução Marginalista. Walras com seu Éléments d’Économie Politique Pure (Elementos da Economia Política Pura) e Jevons com seu The Theory of Political Economy (A Teoria da Economia Política), este em 1874 e aquele em 1871. Uma curiosidade sobre esse evento é que nenhum deles, na época de escrita e lançamento de seus livros, conhecia a existência dos outros “camaradas de embate”. O grande embate da época que ambos buscavam empreender, era responder ou dar uma solução ao paradoxo da água e dos diamantes, proposto por Adam Smith.

Tal paradoxo do valor é o que dá origem a um conceito muito conhecido pelos austríacos. Ainda sobre esse tema, Jevons falava da Utilidade Final e Walras da Rareté… o leitor deve estar pensando: “já ouvi algo semelhante”; ou ainda se perguntando: “e Menger?” Respondendo esta: por sua vez, Menger não havia dado nome ao conceito tratado. Menger, na época, estava preocupado em explicar os fenômenos que aconteciam nos mercados actuais. Respondendo aquela, Weiser deu ao conceito o nome de Grenznutzen que é o que conhecemos por utilidade marginal.

Quando falamos da utilidade marginal, como o próprio nome já nos aponta, falamos da utilidade daquele “bem” que se encontra no “limite”, i.e., o uso desempenhado, na perspectiva de um sujeito, pela “última” – aquela que está na borda, no limite – unidade de um bem. De tal modo, se uma unidade u1 é alocada para o fim f1, a próxima unidade, u2, será alocada para o fim f2, e assim por diante, de outro modo: uma unidade de um bem será alocada para o querer mais urgente, e a próxima unidade para o próximo querer mais urgente. Qualquer outra unidade semelhante acrescentada é “alocada” para o próximo uso “mais valorado”.

Aqui, entra uma “curiosidade” que por muitos é deixada de lado. Quando falamos de unidade, falamos de uma de igual servicibilidade potencial, i.e., falamos de uma mesma unidade, se 5 unidades de um bem x são necessárias para servir a um dado fim, essa unidade de 5x é, em verdade, distinta de uma unidade de x, apesar de ser óbvio que “uma unidade” de x pode ser materialmente “semelhante” às outras “unidades” de x.

Reforçando: falamos de cada unidade. De modo simples: se precisamos de 3 ovos para fazer um bolo, tomando como dados os outros meios, obviamente, 1 ovo não é uma unidade suficiente para fazer tal bolo, apenas 3 ovos podem servir ao fim de fazer um bolo. Sendo 1 ovo incapaz de servir ao fim “fazer um bolo”, não podemos considerá-lo como a mesma “unidade que 3 ovos”, apesar de os ovos serem “substituíveis” uns pelos outros.¹

E já de sequência outra, porém, esta dita por Mises e bem reconhecida entre os autores austríacos: “até o final da década de 1870 não havia ‘Escola Austríaca’. Havia apenas Menger.”² Kirzner nos dirá que “durante a primeira década após sua publicação [do Grundsätze], Menger estava praticamente só.”³

A origem do termo “austríaco” para essa escola

O termo “austríaco” somente surgiu com a oposição da Escola Historicista Alemã, tal designação surgiu como uma expressão pejorativa para aqueles que ela “qualifica” – na época, Menger, Bawerk e Wieser. Dando outro tom, o de Mises, “Para pessoas que não eram familiares com economia, o predicado “austríaco” enquanto aplicado a uma doutrina carregava fortes sobretons dos dias sombrios da contra reforma e da Metternich.

Para um intelectual austríaco, nada poderia parecer mais desastroso do que um relapso de seu país em uma inanição espiritual dos bons velhos tempos.”⁴ Apesar do sentido pejorativo, a tentativa saiu pela culatra. “Tão logo a designação ‘a Escola Austríaca’ ficou famosa por todo o mundo.

A “Escola Austríaca” é, em verdade, um capítulo no grande livro que é a história do pensamento econômico. Mises chama a designação “Escola Austríaca” de anacronismo, mantendo que ela “constitui um capítulo fechado da história do pensamento econômico a partir da época da morte de Menger, em 1921”. E Rothbard quando fala sobre tal, em Man, Economy and State, segue os passos de Mises; usando aspas, e quando não o faz, está se referindo ao ponto histórico.⁶

A importância histórica e científica da Escola Austríaca

Menger, publicando sua obra Untersuchungen über die Methode der Sozialwissenschaften und der politischen Ökonomie insbesondere – aquela que conhecemos por Investigação sobre o Método das Ciências Sociais com Ênfase à Economia Política –, lança um desafio à abordagem da Escola Histórica, um desafio metodológico. O que deu início ao Methodenstreit, que brasileiramente chamaríamos literalmente de “a treta do método”, mas, infelizmente, tomou o nome de “disputa do método”. Uma disputa entre os “austríacos” – no início, somente Menger – e a Escola Histórica Alemã.

Tal disputa colocou em holofote, na comunidade científica, a “Escola Austríaca”. Deixando de ser apenas um termo que denotava uma conotação negativa. Mises ainda diz: “após alguns anos todas as ideias essenciais da Escola Austríaca foram amplamente aceitas como uma parte integral da teoria econômica.”7

Notas

  • ² Mises, The Historical Setting of the Austrian School of Economics (Auburn: Ludwig von Mises Institute, 1984), pág. 1.
  • ⁴ Mises, The Historical Setting of the Austrian School of Economics (Auburn: Ludwig von Mises Institute, 1984), pág. 3.
  • 5 Idem, pág. 19.
  • 6 Para mais sobre, consulte a introdução de Salerno em Murray N. Rothbard, Man, Economy and State (3ª ed., Auburn, Ala.: Ludwig von Mises Institute, 1993), pág. xxix e xxx.
  • ⁷ Mises, The Historical Setting of the Austrian School of Economics (Auburn: Ludwig von Mises Institute, 1984), pág. 19.

Bibliografia:

  • – Ludwig von Mises: The Historical Setting of the Austrian School of Economics (Auburn: Ludwig von Mises Institute, 1984).
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