Quando você recebe o fruto do seu trabalho, seja por meio de um salário ou de rendimentos de aplicações, tem diante de si duas opções: gastar ou poupar. E quando escolhe gastar, especialmente em papel-moeda, pode imaginar que seu dinheiro está longe do olhar vigilante do governo. No entanto, a realidade é que estamos cada vez mais presos em uma rede digital que permite ao Estado monitorar e, potencialmente, controlar cada centavo que possuímos. O uso crescente de ferramentas digitais, como o PIX, apenas reforça essa vigilância.
Você acha que não? Acredita nas promessas do governo e das instituições financeiras de que seus dados estão seguros, de que ninguém pode tocar no seu dinheiro sem a sua permissão? Ah, mas aí está o engano fatal, um erro tão comum quanto trágico.
A verdade, e aqui me permito ser claro e incisivo, é que o Estado moderno, ávido por poder e controle, vê em cada transação digital uma oportunidade de monitorar, regular e, se julgar necessário, confiscar. Não se deixe enganar pelas leis que prometem proteger sua privacidade e seus direitos financeiros. Essas mesmas leis são interpretadas e manipuladas por aqueles que as criam, sempre com um viés que favorece o expansionismo estatal.
Hoje, com a proliferação dos meios de pagamento digitais, como o PIX, estamos mais vulneráveis do que nunca. Cada transação é rastreada, cada centavo monitorado, e o potencial para novas formas de intervenção estatal é praticamente ilimitado. O Estado está sempre de olho, pronto para intervir quando for conveniente—não para você, mas para os próprios interesses dele.
O caso do confisco da poupança em 1990, durante o governo Collor, é um lembrete contundente do que acontece quando você deposita sua confiança no Estado. O governo, em nome do “combate à inflação”, não hesitou em violar a propriedade privada, subtraindo recursos de milhões de brasileiros. E isso foi feito em uma época em que a tecnologia de vigilância era primitiva em comparação com os padrões atuais.
No dia 16 de março de 1990, o governo brasileiro perpetrou um dos maiores atentados contra a propriedade privada da história. Sob o pretexto de conter uma inflação galopante de 84% ao mês, a então ministra da Fazenda, Zélia Cardoso de Mello, anunciou o famigerado Plano Collor, que consistia em nada menos que o confisco das poupanças de milhões de brasileiros.
Essa medida, que bloqueou cerca de 80% dos depósitos em cadernetas de poupança, contas correntes e outras aplicações financeiras, foi justificada como necessária para estabilizar uma economia que já havia sido destroçada por planos econômicos anteriores—Cruzado em 1986, Bresser em 1987, e Verão em 1989, todos sob o governo José Sarney. Estes planos, assim como o Plano Collor, falharam miseravelmente, demonstrando mais uma vez a incapacidade do Estado em gerir a economia sem devastar o patrimônio dos cidadãos.
O resultado imediato foi o caos. Filas intermináveis se formaram nas agências bancárias, onde o desespero dos correntistas se encontrava com a falta de liquidez dos bancos, muitos dos quais sequer tinham dinheiro suficiente em caixa para permitir que as pessoas sacassem os seus próprios fundos. Gerentes bancários chegaram a ser presos, absurdamente responsabilizados pela ausência de recursos que o governo havia tomado.
O impacto foi devastador: falências em massa, famílias arruinadas, e tragicamente, vidas perdidas, pois o trauma financeiro levou muitos ao limite.
Estima-se que o governo tenha confiscado algo em torno de 30% do PIB do país. O Plano Collor não apenas falhou em controlar a inflação, como ainda substituiu o Cruzado Novo pelo Cruzeiro, de forma arbitrária, e congelou preços e salários, enquanto aumentava os preços dos serviços públicos. O resultado foi o aprofundamento de uma crise econômica já sufocante, demonstrando, mais uma vez, que as intervenções estatais não passam de um artifício estúpido e imoral que sempre recaem sobre os ombros do cidadão comum.
Como nos alertou Ludwig von Mises (Intervencionismo: uma análise econômica, Instituto liberal eInstituto Ludwig von Mises Brasi, 2010, 115).
“O intervencionismo não é capaz de gerar umsistema duradouro de organização social. as várias medidas, atravésdas quais o intervencionismo tenta dirigir a atividade comercial, nãoatingem os objetivos honestamente pretendidos pelos seus defensores. medidas intervencionistas dão origem a uma situação que, dopróprio ponto de vista daqueles que as recomendam, é menos desejável do que a situação que eles queriam modificar. criam desemprego,depressão e monopólios. tornam umas poucas pessoas mais ricas eempobrecem a maioria. se o governo não desistir de implementá-las,se teimosamente insistir em corrigir as consequências indesejadas dasintervenções anteriores com mais intervenções”.
O Banco Central está avançando com a criação de uma Moeda Digital. O objetivo é ter controle absoluto sobre o dinheiro que você possui. Isso significa que o governo poderá programar uma data de validade para o seu dinheiro, forçando-o a gastá-lo antes que expire. Mas não para por aí. Eles também poderão determinar onde você pode gastar seu dinheiro, limitando as compras a certas lojas, sites ou regiões, enquanto bloqueiam outras.
Esse nível de controle pode ser ainda mais invasivo, ao vincular sua moeda digital a diversos aspectos da sua vida, como sua pontuação de crédito, histórico de saúde, Identidade Digital e até mesmo outras métricas sociais. Com essa integração, o governo pode programar restrições baseadas em sua pontuação em áreas específicas ou no que consideram ser a necessidade da “economia” naquele momento.
E o mais alarmante é que, com essa moeda digital, o governo terá a capacidade de monitorar cada movimento que você fizer com seu dinheiro, tornando a privacidade financeira uma coisa do passado.
Durante um evento sobre o Bolsa Família, Fábio Araújo, coordenador do Banco Central do Brasil, se viu na delicada posição de acalmar as crescentes preocupações sobre o Real Digital. Em resposta a um dos participantes, Araújo declarou enfaticamente que o Banco Central não tem planos de criar mecanismos de controle de consumo com o Real Digital, desmentindo qualquer especulação de que a tecnologia em desenvolvimento serviria para monitorar a população.
No entanto, é impossível ignorar a história. Araújo assegurou que o Real Digital não contará com mecanismos para confiscar o dinheiro da população, afirmando que o confisco é uma prática contrária ao estado democrático de direito, vedada pela Constituição. Ele ressaltou que, “em 1990 não existia nada de tecnologia digital e mesmo assim foi bloqueado o recurso (Plano Collor). Então para você evitar este tipo de problema, você tem que garantir que o estado de direito funciona. A tecnologia do banco central não tem essa capacidade, não é o foco do Real digital. Entre as diretrizes do Real digital está a segurança e privacidade da informação e é isso que queremos. Isso é uma parte das nossas preocupações, do nosso movimento, mas a preocupação fundamental vai muito além do que o banco central pode responder”.
Apesar de suas garantias sobre as diretrizes do Real Digital, que supostamente incluem a segurança e a privacidade da informação, Araújo admitiu que as preocupações da população vão muito além do que o Banco Central pode responder. E com razão. A tecnologia, por mais avançada que seja, é apenas uma ferramenta. O problema reside na natureza do Estado e em sua inclinação histórica para interferir nas liberdades individuais, especialmente quando possui em mãos os meios para fazê-lo de maneira mais eficaz. Como atesta U. Carrano:
“E assim como um parasita, o estado se mantém e cresce através da destruição da vítima. Só que vai além, o estado ainda se impõe como a solução dos problemas que ele próprio criou e mais, exige adoração e respeito de suas vítimas, mistificando (agora sim) a agressão e introduzindo um sentimento crescente de que não existe outra solução além dele próprio e de toda a sua estrutura monopolista baseada em violência e compulsão.”
A única forma de proteger verdadeiramente seu patrimônio é reconhecer que o governo não é seu aliado, mas um adversário disfarçado de protetor. O Real Digital, com toda a sua promessa de modernidade e eficiência, precisa ser visto à luz dessas preocupações. A história nos ensina que o Estado não pode resistir à tentação de expandir seu controle, e, nesse cenário, a introdução de uma moeda digital controlada pelo governo pode ser mais um passo perigoso nessa direção.